11 janeiro 2012

Dizem que "Também somos o que fazemos".


Quem por aqui passa mais regularmente, já percebeu que não sou Protestante. No entanto, e aproveitando a imagem do post que vou citar a seguir, vejo-os como meus colegas de uma espécie de empresa que tem o mesmo Patrão.
Nos dois últimos parágrafos, nota-se bem esta pertença à mesma cristandade, apesar das diferenças.
"Mais" que tudo isto, é um post com muita graça...


TAMBÉM SOMOS O QUE FAZEMOS


A partir do texto do Evangelho de Marcos sobre a multiplicação dos pães (Marcos 6:30-44) falámos também sobre descanso (porque essa era a intenção da viagem para o lugar deserto onde acontece o milagre). Ao falarmos sobre descanso falámos necessariamente de trabalho. E houve um apelo à compreensão bíblica de que o trabalho é uma ideia de Deus (assim como o descanso). E por isso uma coisa que deve animar os cristãos.


No sermão tive de reconhecer, em comparação com a maioria das pessoas na congregação, as vantagens que me assistem. Tenho o melhor emprego do Mundo. Sou sustentado para estudar a Bíblia e valer uma pequena comunidade de crentes. Mesmo nos dias mais difíceis, que os há, é difícil querer virar-me contra o Patrão. Porque é a igreja que me paga mas o Patrão é Deus. E parece-me que em caso de divergência não há sindicato que me valha contra semelhante chefia.


Depois do serviço de culto duas pessoas provocaram-me a que as tentasse ir convencendo ao longo da semana através de posts do blogue para essa difícil tarefa de ter alegria no trabalho quando o emprego não ajuda. É uma tarefa para a qual duvido estar à altura mas tentar é um compromisso que tenho com as pessoas da comunidade. Por isso, vamos ver.


Nietzsche fazia pouco do cristianismo (e de boleia do judaísmo) pela alegada obsessão da religião com a ideia da produtividade. Ajudou a estilhaçar alguma da harmonia para qual sobretudo o Protestantismo tinha contribuído ao unir a profissão comum de qualquer pessoa à sua fé (Miguel de Unamuno dizia que Lutero tornou civil o cristianismo ou podemos sempre recordar a “Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo” do Max Weber). Desajudados pela curiosidade crescente com as religiões orientais que promovem a contemplação como uma espécie de grau acima do trabalho (uma tendência que o catolicismo, tipicamente mediterrânico, também mostra), estamos hoje num desequilíbrio entre um extremo vindo da herança pragmática protestante e o outro da fascinação com as críticas a essa herança. Ao primeiro as pessoas gostam de chamar capitalismo selvagem e diz: só és aquilo que produzes. O segundo, que não sei como as pessoas lhe gostam de chamar porque leva menos tareia, diz: és aquilo que está para além do que fazes.


Esperando que este contexto sirva para esclarecer alguma coisa, acrescentaria ainda uma convicção pessoal. Confirmando que sou tudo menos imparcial nesta discussão. As Escrituras mostram uma procura por integridade e não para a fragmentação. Por isso Deus é tão sensível ao que os homens fazem. Porque o que os homens fazem mostra muitas vezes de uma maneira mais sincera o que sentem por Deus, acima da eloquência dos discursos religiosos. Se é seguro dizer que o que somos não é apenas o que fazemos, é igualmente seguro dizer que também somos o que fazemos.


Após este longo prelúdio começaria por persuadir a favor da reconexão. Voltar a ligar o nosso coração àquilo que fazemos, partindo do princípio que essa relação pode andar meio desconjuntada. Voltar a ligar a nossa fé ao que fazemos nos nossos empregos (e com os nossos empregos). Porque, em absoluto, e mesmo que as nossas profissões sejam pouco religiosas, continuamos a acreditar que é Deus o nosso patrão. É um primeiro passo. A minha explicação é fraca mas o princípio que me leva a tentar defendê-la tão desajeitadamente é precioso. Deus está interessado em meter-se na nossa profissão.

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