Assistente de Direito Internacional Público, Direito Constitucional e Direito da Integração Económica na Faculdade de Direito da Universidade de Macau. As opiniões contidas neste artigo vinculam apenas o seu autor.
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O BE tem-se intitulado como uma alternativa governativa em Portugal. O crescimento do seu grupo parlamentar demonstra bem a sua força. Sempre considerei o crescimento de partidos extremistas um perigo para a Democracia mas a curiosidade moveu-me a consultar o sitedesta “alternativa”. Aí encontrei o “Compromisso Eleitoral Bloco de Esquerda 2011”. Procureias respostas paracomo é que o BE se propõe cortar a despesa eaumentar as receitas públicas.Para a primeira pergunta, encontrei as seguintes respostas:
I) Combater o despesismo cancelando as parcerias público-privadas (PPP) existentes.
Assim, o BE parte de dois princípios: 1) que “cancelar” os contratos público-privados não custaria nada ao erário público (leia-se, ao dinheiro dos contribuintes) e 2) que ou os serviços que estão a ser prestados pelas PPP devem deixar de existir ou que mais vale o Estado efectuá-los directamente.
Qualquer dos dois pressupostos me parece falível. 1) Os privados que entram em acordos com o Estado esperam, obviamente,que o estado contrate de boa-fé e mantenha o acordo por um determinado período de tempo pelo que incluem sempre cláusulas contratuais que penalizam o Estado caso isso não aconteça. “Cancelar” estas PPP custaria caro a qualquer governo que agisse legalmente (afinal de contas, Portugal ainda é um estado de direito). 2) Sendo que os serviços prestados pelas PPP foramconsiderados necessários pelos governos anteriores, o BE deveria explicar quais os que, afinal de contas, não são necessários. Em alternativa,quais os que considera necessários mas acha que o Estado poderia prover directamente de forma mais barata.
II) Tirar Portugal da NATO (OTAN) e reduzir a despesa com a defesa.
O BE acusa a NATO de ser uma “organização militar agressiva” e considera que se Portugal saísse desta organização poderia poupar muito dinheiro com as forças armadas.
O Tratado do Atlântico Norte afirma a intenção de prosseguir os objectivos da ONU de paz e segurança internacional. Para além disso, visa uma aliança militar apenas quando a integridade territorial de um dos seus membros seja posta em causa. Assim, Portugal não tem obrigação de auxiliar outro membro da NATO se este decidir atacar outro estado, mas apenas se este for atacado em primeiro lugar. Aquilo que a ONU considera ser “legítima defesa”. É isto a “organização militar agressiva”?!
Por outro lado, Portugal também tem o direito a ser defendido por todos os outros membros da NATO em caso de ataque. O facto de Portugal fazer parte da NATO tem permitido confiar no auxílio dos outros estados membros e reduzir as suas forças armadas.
Para além disso, as despesas militares Portuguesas hoje em dia servem principalmente dois objectivos: a participação de Portugal em acções de manutenção de paz e a defesa das suas águas contra pesca ilegal, tráfico de estupefacientes, pirataria, etc.. Estas duas acçõessão obrigatóriasnos termos decompromissos quer com a ONU quer com a UE. Será que o BE também defende que Portugal saia destas duas organizações internacionais?
Como mais nada seja dito sobre o combate à despesa, depreende-se pelo compromisso eleitoral do BE que sem PPP nem Forças Armadas a despesa pública Portuguesaestaria controlada. Vejamos agora quais as soluçõesdo BE para aumentar as receitas do Estado.
I) Criar um fundo de resgate da dívida pública
Ora, este fundo de resgate seria conseguido tributando1) as operações bolsistas, 2) as transferências para paraísos fiscais e 3) as mais-valias urbanísticas.
Em primeiro lugar isto dá a entender que até agora nenhuma destas realidades é tributada, o que não é verdade. O que o BE deveria dizer é que estas seriam ainda mais tributadas. Ora, tributar pesadamente as operações bolsistas e as transferências para paraísos fiscais é extremamente difícil numa altura em que os Portugueses podem livremente contratar os serviços de bancos nos outros países da UE (liberdade de prestação de serviços e circulação de capitais). Uma tributação elevada destas realidades serviria apenas para que os investidores se servissem de mecanismos legais para investir noutros mercados de capitais. Por último, aumentar a tributação das mais-valias imobiliárias só serviria para retirar indirectamente às autarquias receitas com o IMI e IMT e travar ainda mais o jádiminuído sector da construção. Parece óbvio que estas medidas seriam ineficazes no aumentodas receitas e perniciosas para a economia.
II) Imposto único sobre o património ao nível do actual IMI
No fundo o BE quer penalizar quem tem património quer em serviços financeiros quer em acções. Mais uma vez o BE esquece-se que Portugal faz parte da UE: se estas medidas são adoptadas em Portugal, abre-se uma conta noutro estado da UE. Daí, através da internet, pode-seinvestir nas bolsas de Londres, Amesterdão, etc.. Para além desta medida ser ineficaz para realizar verbas para o orçamento de estado, só iria provocar fuga de capitais quando o país precisa desesperadamente desses capitais. Mais uma vez me pergunto se o BE também propõe a saída de Portugal da UE?
III) Imposto sobre as grandes fortunas e aumentos localizados do IRC
No fundo a ideia é “fazer os ricos pagar a crise”. Todos os governos do mundo procuram atrair os “ricos” a investir no seu país mas o BE procura o contrário, hostilizar os tais “ricos”. Note-se que quem tem mais facilidade em mover capitais e investimentos para outros países são precisamente os “ricos”. Os “pobres” e as pequenas e médias empresas não têm alternativas. Parece-me é que o BE quer transformar os “ricos” em “pobres” sem que os já “pobres” tirem daí alguma vantagem.
No que toca a tributar a distribuição de dividendos de empresas auxiliadas pelo Estado, o que me ocorre perguntar é se o estado deveria estar a auxiliar essas empresas? É óbvio que o objectivo de qualquer empresário é receber dividendos, mas o Estado, a intervir no auxílio de empresas, só deverá fazê-lo quando não só estas não geram dividendos mas também estão quase a falir. Mesmo assim, o Estado só deve intervir se as causas para essa situação forem temporárias. O BE olha para a situação de um prisma que nada tem em conta as realidades do mercado.
E assim terminam as propostas do BE para reduzir as despesas e aumentar as receitas do Estado. Depois destas singelas propostas, todas as outras implicam aumento de despesas.
Numa apreciação geral, nota-se neste compromisso eleitoral dois pressuposto. O primeiro é que o Estado tem uma fonte inesgotável de dinheiro. Talvez alguém devesse explicar ao BE que uma enorme parte das receitas do estado vêm dos impostos e que não existe dinheiro público, apenas existe dinheiro dos contribuintes.O segundo pressuposto é que os outros estados da UE e do FMI são uma espécie de Santas Casas da Misericórdia. Usando o dinheiro dos seus próprios contribuintes, estes salvarão Portugal da crise de dívida pública na qual se enfiou. E istoapenas por caridade. Não vão exigir nem juros nemum comportamento que os assegure que Portugal pagará essa dívida. Oh que mundo lindo em que vivemos!
Julgo que só há três adjectivos para as propostas do BE: são demagógicas, inconsequentes e perigosas. Ter o BE numa solução de governo ou com uma forte presença na Assembleia da República seria o maior tiro no pé que se poderia dar à já debilitada economia Portuguesa. Não estamos em tempo de desvarios demagógicos."